Formação e estabilização de agregados no solo
Em condições
naturais, na maioria dos solos, as partículas sólidas (areia, silte, argila e matéria orgânica) estão ligadas entre si, formando agregados. Com base no exposto acima, agregado
pode ser definido como sendo a união de duas ou mais partículas primárias sólidas cuja
força de atração entre ambas é maior do que a força de atração entre as partículas no seu entorno. Neste sentido, a pesquisa científica voltada para esta área é vasta e foi sumarizada por Six
et
al. (2004).
A formação de agregados
no solo pode ser descrita como uma função da floculação de argila,
desidratação ou secagem do solo, efeito físico-mecânico de raízes, microrganismos do solo, união e ação de todos estes atuando conjuntamente em diferentes magnitudes. Braida et al.
(2011) apresentam uma visão mais aprofundada sobre a formação e estabilização de agregados
no solo.
Para que haja formação
de
agregados no solo, faz-se necessário uma condição de floculação das partículas primárias. Para entendermos isso, precisamos
entender a diferença entre
os fenômenos
de
dispersão e floculação que ocorrem no meio em estudo, o solo.
Ambos os
fenômenos
ocorrem por razões químicas, ou seja, pelo balanço
eletrostático entre as
partículas (balanço de cargas das diferentes
superfícies de cada tipo de partícula), cuja
teoria foi proposta por Dejarguin, Landau, Verwey e Overbeek
(teoria DLVO). Essa teoria foi
traduzida para a linguagem matemática e, atualmente o modelo matemático mais popular conhecido é o da Dupla Camada Difusa (DCD), abordado na disciplina de química do solo. De
forma simplificada, a expansão e contração da DCD são regidas tanto pela concentração iônica da
solução do solo quanto pela valência do(s)
íon(s) presente(s)
nesta solução. Assim, para uma mesma concentração de diferentes íons (K+, Ca+2, Mg+2, Al+3, Mg+2, Na+, entre outros)
primeiramente haverá preferência para os de maior valência.
A dispersão ocorre quando, devido à combinação de pequena concentração eletrolítica e/ou valência dos contra-íons, a energia
de
repulsão domina sobre a energia
de atração. As
partículas podem aproximar-se umas das outras devido a vários mecanismos de atração e ao
movimento Browniano, mas a força
de
repulsão aumenta à medida que a distância entre partículas diminui. As partículas não possuem energia
para superar a barreira energética que as separa,
chamada de mínimo primário, e se mantêm dispersas.
Por outro lado, a floculação é causada pelas forças de Van der Walls (forças
fracas, de
curto alcance) e ocorre quando há um aumento na concentração eletrolítica da solução e ou
predominam íons de maior
valência, ocorrendo um predomínio das forças de atração sobre as forças de repulsão. Estes ficarão mais “fortemente” retidos próximo às partículas, aproximando
uma partícula da outra. Neste caso, haverá floculação das partículas, ou seja, pode ser o “gatilho” do processo de agregação (atração de duas partículas mais fortemente que as demais que as
circundam). Neste caso, a DCD
é reduzida, e as partículas podem se aproximar e flocular
Outras forças atuam, tanto na dispersão como na floculação e são discutidas com mais propriedade no texto Partículas
coloidais, dispersão
e
agregação
em Latossolos
–
tópico
Dispersão disponível junto com este material no xérox.
Além das forças eletrostáticas (químicas e físicas) que atuam inicialmente na união de
partículas primárias, a desidratação ou secagem
do solo também
tem efeito sobre a formação de agregados. Estes fenômenos podem ser causados por evaporação
da massa de água
presente no
solo
(aquecimento do solo pelos raios solares incidindo direta ou indiretamente),
por
transpiração das plantas (absorção de água pelas raízes) ou por
ação de ambos os fenômenos (processo chamado de evapotranspiração) e
por
percolação profunda da água. Estes fenômenos
ocorrem
durante toda a maior parte
do tempo e causam a aproximação das partículas umas às outras, formando uma espécie
de cimentação a qual é descrita como um aumento da
coesão do solo, fenômeno que
será discutido mais adiante.
Essa aproximação entre partículas causada pela secagem do solo auxilia na formação de agregados devido ao fato de aproximar as partículas
umas às outras.
Esse efeito de aproximação entre as
partículas causada pela “secagem” do solo pela
diminuição do conteúdo de água é potencializado quando ocorre por ação de raízes de plantas.
Quando as
plantas transpiram perdem água para a atmosfera e com isso
gera um gradiente de potêncial
fazendo
com que
as raízes
absorvam
a
água
armazenada no solo
e
que esteja disponível. Essa água em movimento até a superfície das raízes está carregando íons diluídos em
sua
massa que podem ou não ser absorvidos pelas plantas. Não sendo absorvidos, auxiliam na
cimentação entre
partículas sólidas do solo (juntamente com
a redução
da umidade) remetendo
novamente ao conceito da DCD anteriormente discutida. Além
disso, as raízes das plantas
durante
o durante o seu crescimento (crescem
nos espaços presente do solo – menor
resistência) liberam no seu entorno polissacarídeos que atuam tanto na cimentação entre partículas, bem como é fonte
de
alimento para microrganismos do solo. Assim,
as raízes atuam na formação de agregados de
diferentes maneiras: desidratação do solo, pressão mecânica sobre as partículas de solo em função de seu crescimento, liberação de agentes cimentantes
(polissacarídeos) e pelos radiculares que “amarram” microagregados já formados.
Os microrganismos
presentes no solo se beneficiam
dos exudatos
liberados
pelas
raízes das plantas para
o
crescimento da
população,
mas também decompõem outros
materiais
orgânicos presentes no solo que são fontes de carbono. Além
disso, muitos destes
microrganismos
são fungos. Estes
fungos
podem auxiliar na
formação e estabilização
de agregados em seu estado inicial de formação pela
ação de estruturas chamadas hifas. Estas
podem formar uma rede
que envolve microagregados aumentando
a estabilidade do agregado formado, mas também “amarrando” outros microagregados presentes no seu entorno, formando um agregado maior.
Além dos fungos, outros organismos maiores também
atuam para formação e estabilização de agregados, como é o caso das minhocas, as
quais processam material orgânico
juntamente
com material mineral liberado como produto final coprólitos, que tradicionalmente
conhecemos
por
húmus. Este apresenta forte ligação entre partículas minerais
e orgânicas
que,
além
de poder ser considerado um microagregado, pode atuar como agente “nucleador” de outros microagrados.
A este tipo
de
estrutura, formada por
partículas orgânicas (matéria orgânica), cátions polivalentes e
minerais
(argila), chamamos
de complexos organominerais e foi apresentada por Edwards &
Bremner (1967). A união de dois ou mais complexos deste tipo constituiriam
um
microagregados.
Neste sentido, a influência
da
mineralogia na estabilidade de complexos organominerais tem papel importante,
não diretamente pela quantidade de argila, mas sim pelo tipo de mineral presente na fração argila de um solo. Estudos desenvolvidos por Inda Junior et al. (2007)
apontam
que
os minerais Goethita e
Hematita (minerais eu conferem cores amarelas e vermelhas ao solo,
respectivamente) apresentam uma importante contribuição na estabilidade de microagregados, assim como o teor de carbono orgânico no solo.
A interação singular ou em
conjunto dos diferentes processos que iniciam
a formação de agregados também atuam na formação de agregados maiores, os chamados macroagregados. No
entanto, para chegar ao nível de macroagregado, um
único fator isolado dificilmente conseguiria isso
porque quanto maior
o agregado, maior é o grau de complexidade entre as ligações, bem como maior
é à força de ligação entre as partículas isoladas e entre microagregados.
Assim, a teoria de formação de agregados maiores (macroagregados) proposta por Tisdall
& Oades, 1982) os quais apontam que há uma hierarquia na formação de agregados do solo e que, macroagregados
seriam formados
a partir de microagregados, está muito intimamente ligada
ao
grau de interação entre
os diferentes processos
envolvidos na agregação do solo. Esta teoria é
um
expressivo avanço no entendimento de formação e estabilização de agregados (Figura
1).
De uma maneira geral, a formação dos microagregados está intimamente relacionada
a processos físico-químicos, como floculação, adsorção, interação físico-química (atração
eletrostática e troca de ligantes), tendo a matéria orgânica
humificada (MOH) um dos principais
agentes responsáveis pela sua estabilidade, juntamente com os minerais presentes na fração
argila.
Figura 1. Esquema hierárquico de formação de agregados.
Na medida em que aumenta o grau de complexibilidade e ligação entre os
diferentes
agentes formadores de agregados no solo, o solo vai caminhando para ter agregados maiores, chamados macroagregados. Estes têm sua formação de natureza biológica e sua manutenção (estabilidade) depende muito da adição constante de fontes de carbono, ou
seja, adição de resíduos vegetais para repor compostos orgânicos
transitórios que são decompostos pelas populações microbianas.
Assim, práticas de manejo que adicionam continuamente material orgânico ao solo, favorecem a formação e manutenção de agregados maiores
e mais
estáveis.
A manutenção de um bom estado de
agregação do solo
passa por algumas
práticas fundamentais por parte de quem está manejando
o solo. Estas práticas envolvem o menor revolvimento possível
do
solo (preferencialmente o não revolvimento do solo, como a adoção da semeadura direta e ou preparo mínimo); uso de rotação de culturas (diferentes culturas, sistemas radiculares, relações C:N (carbono:nitrogênio) da palhada, adições de palha, exploração do perfil
do
solo pelas raízes; redução no intervalo
entre colheita e semeadura
das
novas cultura no campo;
manutenção do solo coberto (menor
perda de água, menor amplitude térmica diária, menor
germinação de plantas indesejáveis) evita formação de selo1 e da crosta2 e, o tráfego de máquinas em condição de friabilidade3 do solo, evitando imprimir danos destrutivos a estrutura interna do solo.
A análise do estado de agregação do solo pode ser realizada em laboratório por meio de
separação mecânica em peneiras com diferentes diâmetros nominal da malha. Essa separação se
dá
por meio de agitação mecânica a seco ou
em
meio líquido, contendo água. Ambas as
metodologias e suas peculiaridades estão descritas de maneira a facilitar o entendimento pelo usuário em Klein (2008) intitulada “Agregados do solo” que acompanha esse material.
Estrutura do solo
Em condições
naturais, na maioria dos solos, as partículas sólidas (areia, silte, argila e matéria orgânica) estão ligadas entre si, formando um agregado, como visto anteriormente. As
forças que tendem a manter estas partículas ligadas
entre si, dentro de um mesmo agregado, são mais intensas do que as forças de ligação entre os agregados
adjacentes, definindo, assim, planos
de
fraqueza (ou clivagem)
onde os agregados podem ser separados. O conjunto destes
agregados forma a estrutura do solo. Agregados naturais
individuais são denominados
unidades
estruturais.
Estrutura do solo pode ser definida como a condição física do material do solo expressa
pela
dimensão, forma e arranjo das partículas sólidas e poros a elas associadas e que podem ser
separadas entre si por pontos de fraqueza.
A estrutura
do
solo é uma característica
morfológica que varia de um sol para outro e
também entre os horizontes de um mesmo solo, constituindo um critério usado para separação de horizontes do perfil do solo. Para a descrição da estrutura são levados em conta o grau de desenvolvimento das unidades estruturais, a classe e o tipo de estrutura.
O grau expressa a intensidade das ligações dentro e entre os agregados
e é
determinado pela nitidez com a qual os agregados se apresentam no perfil e pela resistência que oferecem à desagregação quando são removidos e manipulados.
A classe refere-se ao tamanho dos
agregados. O tipo refere-se à forma dos
agregados. Os diferentes
tipos de agregados que podem ocorrer no solo estão representados na Figura 2.
Figura 2. Tipo de estrutura, descrição e diagrama mostrando sua forma.
A descrição
da estrutura
é feita no campo, observando-se detalhadamente os agregados por ocasião de sua remoção do perfil. A anotação é feita na seguinte ordem: grau, classe e tipo. Por
exemplo: fraca, média, blocos
subangulares.
Como observado na Figura 2,
há diferentes tipo
de estrutura do solo, cada
uma
desenvolvida em diferentes horizontes no solo. Mas o que podemos inferir com base na estrutura
do
solo sobre as propriedades
de
um solo condicionadas por
cada tipo de estrutura?
As estruturas do tipo granular e grumosa se dispõem no horizonte A, ou seja, nos
horizontes mais superficiais do solo. Este tipo de estrutura tem forte influência da ação de raízes
das
plantas, do tipo de manejo imposto ao solo, das variações do ambiente externo (temperatura, chuva, etc). Solos
ou horizontes com este
tipo de
estrutura apresenta boa aeração,
bom movimento de água (macroporos), menor resistência das raízes ao crescimento e boa capacidade de armazenamento de água (microporos
dentro de agregados).
Por outro lado, solo com estrutura laminar apresentam alguns problemas de ordem física,
como maior densidade (partículas orientadas em maior
grau
de empacotamento), menor aeração, menor condutividade hidráulica (fluxo
de água), maior restrição ao desenvolvimento de raízes
de plantas, menor
difusão de ar, etc. Este tipo de estrutura pode ocorrer tanto em condições
naturais como ocasionadas por
problemas de compactação adicional
por
tráfego de máquinas e ou animais em condições de umidade do solo acima do estado de friabilidade.
As estruturas do tipo bloco, prismática e colunar são encontradas no horizonte B dos
solos. Diferente dos tipos granular, grumosa e laminar, este tipo de estrutura
é pouco ei nada
afetado pelo manejo do solo. Logo, para estudos de gênese do solo, o tipo de estrutura encontrado
no horizonte B é usado para diferenciar classes de solos, uma vez que sua formação é regida por condições
físicas naturais do solo.
--------------------------------------------------------------------------------------------------------------- 1 Selo superficial: ocorre pelo colapso dos agregados do solo por ação de forças externas (pressão, impacto da gota
de chuva diretamente sobre o agregado) quando úmidos
formando uma camada de lama (orientação das partículas de areia, silte e argila), tipicamente de alguns milímetros, que obstruem os macroporos
da camada superficial e assim
inibe a infiltração de água e trocas gasosas entre o
solo e a atmosfera externa.
2 Crosta: é a secagem (desidratação) da fina camada de solo formada pelo colapso dos agregados, chamada selo. Esta, mesmo formada por alguns milímetros, se torna extremamente
resistente ao rompimento o que impede a emergência de sementes.
3 Condição de umidade do solo na qual um agregado de solo quando exposto
a uma força externa se rompe em
frações menores. Nesta condição de umidade do solo é indicada
a maioria das práticas e operações
agrícolas, pois não ocorrem danos irreversíveis a
estrutura do solo, bem como o solo apresenta
a menor resistência ao rompimento
por
ação de um implemento, diminuído
o gasto energético de preparo do mesmo.
Bibliografia
BRAIDA, J. A.; BAYER, C.; ALBUQUERQUE, J. A. &
REICHERT, J. M. Matéria orgânica e seu efeito na física do solo. In: Tópicos em Ciência do Solo, Vol. VII, 2011.
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Variáveis relacionadas à
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